sábado, 30 de maio de 2009

Diálogo de amor

E ele contemplou da varanda as luzes da cidade, que piscava pra ele. Suja e molhada. Como alguém que chora, pedindo socorro. Aquilo tudo era tão blasé, tão filme alternativo, meu Deus. Por um momento ele desejou ser fumante só pra acender um cigarro e complementar a cena.
- A verdade é que a gente não dá certo junto, meu amor.
Ela encarou o fundo da taça e a balançou de leve. Não queria ouvir nada daquilo de novo, não queria continuar com aquela conversa, mas sabia que não podia evitar por muito mais tempo. Como aquele homem era insistente, caramba.
- Não dá certo por que, bem? Sinceramente, eu não entendo quando você vem pra mim com essas conversas. - É claro que ela entendia, mas não era idiota e sabia que se fazer de idiota às vezes é a melhor solução. Principalmente quando se tratava de discussões inúteis. Essa era a sua estratégia favorita nesses casos.
- Amor, cê sabe do que eu tô falando, não se faz de idiota. - Ele também não era idiota.
- Ô bem, fala assim não. Juro que não sei do que cê tá falando. - Não era momento de ceder. Não iria ceder nem se dar por vencida; era assim que agia sempre, já tinha se acostumado até.
- Amor, deixa disso. Olha pra mim, pra você, pra gente. Tão diferentes, tão, tão...
Ela pousou a taça, levantou-se, ajoelhou-se e o abraçou por trás, cuidando pra respiração esquentar o pescoço dele no ponto certo. Também sabia jogar e não queria perder aquele cabo-de-guerra.
- Que bobagem é essa, mozinho?
- Bobagem quê, amor! Não se faz de besta, vai. - Tentou se desvencilhar, mas não com a intensidade que queria, ou que deveria. Os braços dela eram quentes ao envolvê-lo; a respiração era quente no seu pescoço. - Não dá mais. Nós somos pólos opostos.
- Ah, pára de graça, amor. Você sabe que isso é pura desculpa. - Ela fez cara emburrada, biquinho. Agora estava comprando a briga pra valer. Pela primeira vez. O modo como ele havia falado, olhado, alguma coisa, dessa vez a havia aborrecido pra valer. - O que é que tá te incomodando de verdade? Digo, de verdade mesmo, abstrindo essa besteirada existencialista?
Ela desvencilhou-se dele. Ele não queria admitir, mas aquilo o amuou um pouco. Os braços dela eram quentes, aconchegantes. Precisou de um segundo pra clarear a cabeça e pensar racionalmente.
- Pô, amor. Besteirada existencialista, nada. Eu sou tão livre, você retraída. Eu sou relaxado e você é preocupada demais. Você é de cidade e eu sou de natureza... Eu já envelheço, você tem uma vida inteira pela frente. Isso tudo me desanima, que saco.
- Que saco digo eu. Volta e meia você me vem com essa conversa.
- Má, que inferno! Eu aqui falando uma coisa séria com você e --
- Inferno que você mesmo inventa, criatura! Fica divagando nessas coisas que não te levam a nada, dizendo que "ah, amor, a gente isso, a gente aquilo"! Parece até que tem medo de ser feliz!
- Medo de ser feliz? Cê tá de sacanagem? Quer dizer que agora o problema é comigo, é ou não é!?
- Se não é contigo, é comigo, porque não tem outra explicação! Muito diferentes? Faz favor! "Envelhecendo", você? Você é dez anos mais velho que eu só, não tem nem quarenta. "De cidade, de campo" que conversa é essa? O que importa é onde a gente pode morar nesse momento! Diferença nunca separou casal nenhum! A gente viveu muito bem com elas até agora!
- "Até agora" não foi muito tempo.
- Agora o problema é porque a gente tem pouco tempo de relacionamento? Tenha dó!
Ela ameaçou levantar-se, ele a segurou pelo pulso.
- Me escuta, que droga! Eu tô aqui falando uma coisa que é importante pra mim, que me aborrece, e você faz que não tá ouvindo!
Retirou o pulso bruscamente do aperto, sentindo o lugar arder, vermelho. Tanta coisa que sempre quis dizer, mas nunca disse, enquanto se fingia de idiota.
- Eu tô ouvindo! Ouvindo como eu sempre ouvi, desde a primeira vez que você chegou com isso pra mim! Mas agora não dá mais, não aguento mais. Agora quem tá quase jogando a toalha sou eu. Não suporto mais esse seu negativismo, essa sua coisa de só ver o que tá errado entre a gente, nunca ver o que tá certo. Olha como a gente tava antes de você trazer esse assunto; sentados no chão, bebendo, olhando a cidade, conversando, se curtindo! Quantos casais você conhece que faz isso, hein? Me fala, me diz!
- Eu--
- Quer saber? Não diz nada. Você se fecha pro que pode de fazer bem e, honestamente, não quero mais saber de seus neuros e suas neuras, pra isso eu não ganho. Eu amo você, quero ficar com você, mas te juro que você realmente me faz pensar em terminar tudo quando age desse jeito. Mesmo que eu fique calada. Mesmo que eu me faça de idiota. Mesmo que eu pareça não ouvir. Eu também sinto, sabe? Sinto...
Silêncio. Ela fez que ia se levantar, mas parou ao ouvi-lo falar.
- Amor...
- Oi?
- Me abraça de novo?
E os dois seguiram abraçados.

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Ô textinho chato esse que eu fiz, viu! Se você conseguiu ler tudo até aqui, praabéns, você é um(a) vitorioso(a).
Só escrevi mesmo porque essas porcarias não me deixam em paz enquanto eu não tiro elas da cabeça e ponho no papel.

Silier, estou respondendo os comentários! Mas eu respondo os comentários nos blogs das pessoas que me deixam comentários e o seu blog não tem sistemas de comentários. Então não posso responder os seus comentários, o que é irônico, visto que foi você quem me fez voltar a respondê-los.
De um jeito ou de outro, não sei se eu conseguiria comentar no seu blog. Ele me faz sentir burra.

E me faz sentir saudades de uma pessoa, mas essa parte não tente entender.

Ainda faltam duas pessoas pra eu poder responder a tag de Marie! Quem se habilita?

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1 Comentários:

Às 5 de junho de 2009 às 04:57 , Blogger S. B. disse...

Gabee, não precisa ser um vitorioso para terminar de ler bons textos. ;O

ah, sim, o problema do meu blog é que eu não me preocupo em ser tão compreensível. eis o motivo das baixas visitas. :P

hum, de toda forma, gostaria que cê postasse então um comentário lá no blog Folha existencialista, que eu participo tbm: www.folhaexistencialista.com.br

(:

 

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